segunda-feira, 24 de maio de 2010
Para viciados em História
Se você é como eu e tem uma queda por livros de História - qualquer livro de História, pode ser o mais didático mesmo - então vai gostar um bocado de "Uma breve história do mundo", esse best seller internacional inesperado que vendo feito água e - espera-se - vem sendo lido avidamente pelo mundo afora. Você - sobretudo você que não olha com muita simpatia para livros de História, sobretudo se forem livros didáticos de História - há de pensar que se trata apenas de mais um novo livro sobre a mesma e velha história da humanidade, só que turbinado pelo marketing das editoras dos quais ninguém está livre. Pode ser, mas não é só isso.
Como um fã meio abilolado dos livros de História - não esqueço aquele antigo manual escolar da sétima série que trazia uma foto da acrópole de Atenas sobre fundo verde na capa - preciso dizer que este aí é, sobretudo, um livro divertido, leve, de abordagens inesperadas. Talvez por isso venha fazendo esse sucesso tudo. Não é apenas por contar a história do homem em linguagem coloquial, de bate papo na esquina (ao menos as esquinas onde ainda se respeita o léxico) - o que ele de fato faz - ,mas é por optar por iluminar a história usando luzes que nem sempre são valorizadas. Vamos aos exemplos, que tornam tudo mais claro: há um capítulo denominado, veja só, "A cúpula da noite". Só pelo título, o leitor desconfiado já fareja alguma coisa diferente, uma pegada algo poética, uma sugestão que vai além do fato cru.
Pois esse capítulo todinho é sobre isso mesmo: sobre a importância, que não podemos calcular bem nos dias de hoje, que tinha a noite, com suas estrelas, para a orientação dos povos que ainda estavam saindo lentamente da África para a Ásia e de lá para muito mais longe. Um capítulo inteiro só sobre isso, sobre como esses elementos - noite, estrelas, fogo, claridade e escuridão - orientavam, amedrontaram, preveniram ou danificaram a existência do homem de então sobre aquela terra primitiva. Outro exemplo é o capítulo que se dedica somente a lembrar como o mundo medieval era desprovido de cores. Não havia nem um décimo da variedade de cores que para nós, hoje, são até banais. Não havia variedade de cor nas paredes das casas e demais instalações humanas, não havia cores nas roupas. Era um mundo cor de terra e nada mais. E a tonalidade rubra era um artigo luxuoso, valorizado, caro. Só para os muito ricos. E o Brasil tem participação decisiva neste capítulo, onde é citado várias vezes, devido à coloração avermelhada que os europeus monocromáticos obtinham do nosso pau-brasil.
É disso que se compõe a graça dessa breve história do mundo que conta tudo de novo com um gostinho renovado. Estão lá a rota da seda, a era das navegações, a importância da conexão entre o protestantismo e a criação da imprensa, as mudanças que o surgimento do islamismo provocou nas feições do mundo e por aí afora. Mas está, sobretudo, a crônica de um personagem múltiplo chamado humanidade, narrada com o ritmo de uma reportagem deliciosamente bem circunstanciada. Um livro que supre a necessidade premente dos viciados em História, mas também alimenta os que querem apenas uma refeição rápida dessa iguaria que passa da mesa dos egípcios para o banquete do planeta globalizado.
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