Ontem foi dia de funeral na televisão. Uma estranha coincidência, com a estranheza particular que convém às coisas que coincidem, fez com que tivéssemos dois desses eventos em horários privilegiados e ampla expectativa de público. O primeiro foi um funeral de verdade, enquanto o outro se deu na ficção. Mas como toda estranheza é pouca quando se trata dessas colisões temporais e conceituais – que é como poderíamos qualificar toda as coincidências – existe ainda o agravante de que o funeral de verdade parecia muito com um evento ficcional, enquanto o velório inventado pela teledramaturgia tinha muito de real.
O funeral de verdade, o planeta inteiro sabe que foi o de Michael Jackson. Um velório transformado em espetáculo planetário com elenco estelar, roteiro apurado, desempenhos marcados – no que parece ter sido algo tão bem elaborado pelos mestres do entretenimento (os americanos) que deu até para culminar com uma cena de emoção autêntica, pois que cuidadosamente cultivada: a emoção da filha exposta tão prematura e perigosamente quanto o foi o próprio morto quando criança. Mas o fato é que, de tão medido, planejado, perfeito e sintonizado, o funeral de Michael Jackson parecia não ser algo de verdade. Se uma fã enlouquecida, ou um clone como há milhares no mundo, tivesse quebrado os protocolos e subido àquele palco para se esborrachar em lágrimas sobre o ataúde de ouro, numa cena entre italiana e nordestina, aí sim teria dado credibilidade ao todo. Teria sido a falha humana que confirma a autenticidade do evento. Sem isso, foi como uma abertura de olimpíada, como uma entrega de Oscar. Perfeito, previsível, controlado – belo, mas estranho quando se trata de um funeral.
O funeral de ficção foi o do diretor teatral feito por Pedro Paulo Rangel na minissérie “Som e Fúria”, a aventura televisiva do cineasta Fernando Meirelles e sua produtora O2. Foi interessante e vivo ver a performance desse ator tão querido pelos brasileiros em cenas de desespero implícito pela noite paulistana, Pedro Paulo bêbado vagando entre a frustração pessoal e as luzes difusas da cidade, minutos antes de ser esmagado por um caminhão de presunto – e aí a nota humorística, que brinca com as ironias da vida real, já se apresentou como uma marca do novo programa. O funeral é no Teatro Municipal de São Paulo e é evidente que, como na vida real – e ao contrário do que ocorreu com Michael Jackson – tudo dá errado. Da luz à decoração, das gafes involuntárias ao mico do pastor homofóbico que deixa a platéia perplexa. Mas, embora produto da construção elaborada por roteiristas, diretor, atores, cenógrafos e demais envolvidos na produção de um produto de teledramaturgia, o funeral de Pedro Paulo foi o mais verdadeiro do dia na televisão. Pelo que continha de inusitado, de falho, de ridículo até.
Tem um ditado batido que só ele que diz que “a vida imita a arte”. Ontem, no funeral de Michael Jackson, não havia vida nem arte – foi tudo espetáculo. Se dizem que no Brasil tudo acaba em pizza, quando se trata dos EUA a gente pode inferir que tudo acaba em show. Vide julgamentos célebres, os mil e um produtos que o 11 de setembro rendeu em filmes, o próprio fenômeno Obama, com um forte componente de evento coletivo para todas as mídias. Pois bem: o funeral da minissérie “Som e Fúria”, sim, teve um quê de vida real, filtrada por meio dos instrumentos que a dramaturgia televisiva usa para emular a arte, quiçá a grande arte – algumas vezes, chegando bem perto dela.
Funeral por funeral, yes, nós temos Meirelles, e o nosso show venceu.
O funeral de verdade, o planeta inteiro sabe que foi o de Michael Jackson. Um velório transformado em espetáculo planetário com elenco estelar, roteiro apurado, desempenhos marcados – no que parece ter sido algo tão bem elaborado pelos mestres do entretenimento (os americanos) que deu até para culminar com uma cena de emoção autêntica, pois que cuidadosamente cultivada: a emoção da filha exposta tão prematura e perigosamente quanto o foi o próprio morto quando criança. Mas o fato é que, de tão medido, planejado, perfeito e sintonizado, o funeral de Michael Jackson parecia não ser algo de verdade. Se uma fã enlouquecida, ou um clone como há milhares no mundo, tivesse quebrado os protocolos e subido àquele palco para se esborrachar em lágrimas sobre o ataúde de ouro, numa cena entre italiana e nordestina, aí sim teria dado credibilidade ao todo. Teria sido a falha humana que confirma a autenticidade do evento. Sem isso, foi como uma abertura de olimpíada, como uma entrega de Oscar. Perfeito, previsível, controlado – belo, mas estranho quando se trata de um funeral.
O funeral de ficção foi o do diretor teatral feito por Pedro Paulo Rangel na minissérie “Som e Fúria”, a aventura televisiva do cineasta Fernando Meirelles e sua produtora O2. Foi interessante e vivo ver a performance desse ator tão querido pelos brasileiros em cenas de desespero implícito pela noite paulistana, Pedro Paulo bêbado vagando entre a frustração pessoal e as luzes difusas da cidade, minutos antes de ser esmagado por um caminhão de presunto – e aí a nota humorística, que brinca com as ironias da vida real, já se apresentou como uma marca do novo programa. O funeral é no Teatro Municipal de São Paulo e é evidente que, como na vida real – e ao contrário do que ocorreu com Michael Jackson – tudo dá errado. Da luz à decoração, das gafes involuntárias ao mico do pastor homofóbico que deixa a platéia perplexa. Mas, embora produto da construção elaborada por roteiristas, diretor, atores, cenógrafos e demais envolvidos na produção de um produto de teledramaturgia, o funeral de Pedro Paulo foi o mais verdadeiro do dia na televisão. Pelo que continha de inusitado, de falho, de ridículo até.
Tem um ditado batido que só ele que diz que “a vida imita a arte”. Ontem, no funeral de Michael Jackson, não havia vida nem arte – foi tudo espetáculo. Se dizem que no Brasil tudo acaba em pizza, quando se trata dos EUA a gente pode inferir que tudo acaba em show. Vide julgamentos célebres, os mil e um produtos que o 11 de setembro rendeu em filmes, o próprio fenômeno Obama, com um forte componente de evento coletivo para todas as mídias. Pois bem: o funeral da minissérie “Som e Fúria”, sim, teve um quê de vida real, filtrada por meio dos instrumentos que a dramaturgia televisiva usa para emular a arte, quiçá a grande arte – algumas vezes, chegando bem perto dela.
Funeral por funeral, yes, nós temos Meirelles, e o nosso show venceu.
Um comentário:
Tenho adorado essa mini-série, porém confesso que a morte do rei do pop tem me deixado um vazio. Não sei nem explicar o porquê, é como um mito vivo que foi construido artificialmente pela mídia e que nós compramos como a mais pura verdade durante toda a vida.
É isso.
Postar um comentário