Não faz muito tempo, o Centro Cultural Banco do Brasil promoveu um ciclo de homenagens ao compositor clássico Giacomo Puccini. Uma das atrações programadas era a execução de árias de óperas, em duas sessões diárias, com entrada gratuita ao meio dia e simbólica ali pelas nove e pouco da noite. Como alimento uma atração irresistível pelos programas gratuitos que Brasília oferece - como um contraponto aos programas caríssimos dos quais quero distância - lá fui eu ao CCBB, disposto a me ilustrar um pouco pagando quase nada, com a chancela de qualidade que essa instituição garante às suas promoções.
Foi uma bela noite - simples e emocionante. No palco, cantores líricos de várias latitudes. Uma garota bonita aqui mesmo do Cruzeiro, o bairro brasiliense que até hoje conserva uma ginga carioca trazida pelos seus primeiros ocupantes. E um rapagão de voz tronituante que foi apresentado como uma promessa do canto lírico mundial -um jovem que já então tinha na agenda uma série de apresentações com ninguém menos do que Plácido Domingo (e que outro dia foi destaque na revista "Bravo"). Havia os músicos, claro - aquela leva de violinos que tira o ouvinte do chão quando toca essas composições criadas há tantos anos, cheias de observações sonoras, repletas de revoadas acústicas e dotadas de harmonias humanamente celestiais.
E havia, apresentando todo esse pessoal; melhor, regendo todo esse pessoal, um sujeito baixinho, de cabeleira à Carlos Gomes e ar de alma renascentista com roupagem contemporânea. Essa pessoa era o maestro Sílvio Barbato, de quem eu já ouvira muito falar, por ser tido como uma figura meio polêmica no período em que estivera à frente da direção do Teatro Nacional Cláudio Santoro, aqui de Brasília. Então aquele era o tão falado Barbato. Pareceu-me um sujeito simpático mas, sobretudo, apaixonado pela matéria de seu ofício - a música.
Vi nele, sim, um ar de quem caminha alguns milímetros acima do solo dos mortais - uma elevação que a sua baixa estatuta reforçava ainda mais. Mas esse traço de superioridade encontrava um contraponto no sorriso sempre aberto. E, ademais, havia nele aquela aura que qualquer olho atento enxerga quando depara com alguém tomado pela força invisível de uma paixão. Silvio Barbato transpirava música, isso estava muito claro. E o concerto, fortemente marcado por um caráter didático, encontrou nele um professor e tanto. Acredito que todos os que, leigos como eu, assistiram àquela homenagem musical a Puccini, saíram mais ricos daquela noite do CCBB. Saíram, diria mesmo, flutuando.
Como se carregassem em si, ao mesmo tempo, o peso de um air bus e a leveza de uma só nota musical. Se alguém ainda não ligou o nome à pessoa, tenho que dizer, agora, que esse mesmo Sílvio Barbato é um dos passageiros que o destino pulverizou sobre o Atlântico no desastre que tanto nos deixa chocados quanto dá nova sensibilidade a nossas almas saturadas de trabalho, compromissos, horários, carnês e cupons.
2 comentários:
bela e doce homenagem ao Barbato. parabéns.
Tião vc tá foda! Tudo muito bonito mesmo!
É bom saber um pouco mais dessas pessoas por você.
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