terça-feira, 17 de maio de 2011

Dossiê Manoel de Barnabé


Caricatura simplifica demais a variedade do mundo e não fica bem em ninguém, mas a gente bem que pode abrir uma exceção e dizer que Manoel de Barnabé é a típica figura popular seridoense. Feirante, vende “roupa feita” em várias cidades da região e não apenas na sua Acari de moradia. Também vende rede da boa e acho que faz a rota para as cidades que produzem este artefato tão regional, como a obrigatória e paraibana Santa Luzia, onde compra a mercadoria e sai revendendo pelo sertão do RN e da PB.

O diferencial de Manoel de Barnabé - sim, ele não mora em Higienópolis mas é um ser humano muito do "diferenciado" - é que enquanto compra, vende e revende, Manoel pratica a secular arte da conversa.Sobre o que quer que seja. Mas, de preferência, assunto que renda uma boa teima. Polêmica, como se diz na cidade grande. Mas por lá é teima mesmo. Por exemplo: se um trator daqueles dos pneus traseiros bem grandes descer uma ladeira parelha e meia com um caminhão de mudança em ponto morto, quem chega primeiro lá embaixo no fim do declive?

São questões assim, impossíveis de solucionar e repletas de non sense interiorano, que fazem o dia-a-dia da célebre “barraca da teima” que arrisco dizer, mas não tenho certeza, é a própria barraca de Manoel na feita de Acari. Ou então é algo que só existe virtualmente: onde dois ou mais se encontrarem para tirar uma boa e insolúvel teima nos oitões de Acari a Cruzeta, com a presença de Manoel de mediador (ou complicador) lá estará instalada a barraca da teima, sem precisar de lona e assento.

Manoel também é praticante de outra arte implacável na luta contra qualquer espécie de tédio interiorano: o dominó. Em Acari, ele deu um passo à frente e fundou uma “academia” de jogadores que se reúne nas praças da cidade. Jogadores de carteirinha, que fique claro. Carteirinhas idealizadas e encomendadas por Manoel, com seu raro talento para captar os anseios nem um pouco políticos da rapaziada ao redor. É um personagem bom de conversa, o homem da irreverência sertaneja, o antifilósofo da vida prática na cidade pequena. Ocupa-se de assuntos menores com a maior das importâncias. E vice-versa, só pra contrariar.

Entretém a todos como um talk show man forjado pela geografia local. Ah, sim: no passado, trabalhou nos Correios, mas foi dispensado nos tempos da ditadura militar. Jura que foi perseguição política e quando soube da comissão do governo que indeniza vítimas do arbítrio, achou que se enquadrava. Talvez não fosse bem o caso – era querela local. Mas pense num assunto bom pra começar uma teima, hein, Manoel?

*Este post é resultado de um e-mail enviado a uma colega jornalista que está no encalço de Manoel e precisava de mais informações sobre ele. Era um dossiê muito interessante pra morrer na ciclovia do correio eletrônico, daí ser reaproveitado aqui no SOPÃO. E, como um documento subjetivo sobre uma figura amiga, pode estar naturalmente coalhado de erros e meias verdades, mas o essencial da figura, garanto, tá espelhada no texto aí acima.

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