sábado, 30 de outubro de 2010
Eu, pecador
Neste domingo, mais ou menos por essas horas, estarei pecando. Gravemente, espero. De um tipo de pecado que, ao contrário do que dizia aquele frevo pagão, existe sim ao sul do Equador. E como existe. Estarei pecando com plena consciência da infração que cometo, com os braços estendidos à disposição das algemas da instituição que quer me conter. Dizem que é tão grave a natureza deste pecado, que um novo mandamento deveria ser instituído para conter os instintos baixos de quem o comete com indecência assumida. Sou um deles, e nem um décimo primeiro mandamento me deteria. Vou pecar como um condenado que caminha para a forca com um sorriso cínico no rosto. E se há algo que posso fazer para tornar ainda mais cabeludo o meu pecado, é o que vou fazer agora: convidar você que me lê neste momento para pecar comigo.
Não vejo a hora de cometer meu sumo pecado, minha anti-eucaristia na mesa de quem se dispõe a dar ordens ilegítimas ao rebanho. Serei uma espécie de Judas sem suicídio na cena seguinte. Um coroinha que arranca fora as roupinhas brancas e bem passadas da celebração dominical, rola na poeira da rua fétida como um gato sem dono e descobre que, dependendo do ângulo pelo qual se veja o mundo, fica muito melhor com sua nova aparência de trombadinha infecto. São as faces do meu pecado, que sorri para você que está tentado, bem tentado, mas ainda não saiu da condição de indeciso. Não sou uma cantora de bolero dos anos 50, mas reforço o meu convite: eu tenho um pecado novo, venha pecar comigo.
O extremo pecado que vou cometer é de desobediência. Sua natureza está menos ligada às coisas da carne e mais à matéria da alma em si. É minha alma que clama por esse pecado de opinião – esse desvio de conduta materializado na forma de um voto eleitoral, e não um voto de romeiro como o ato de contrição aqui escrito poderia dar a entender. Vou pecar, com prazer e luxúria cidadã. Eu, pecador, amanhã ratificarei esta minha condição à qual vinha dando tão pouca importância. Amanhã, vou pecar votando em Dilma Roussef para presidente da República do Brasil, reino da terra, planeta solto no espaço em meio a sabe-se lá qual aventura mística.
Vou pecar contra a criança que eu fui, educada no catolicismo mais tradicional que, se me omitiu páginas infelizes da história desta religião, também teve a dádiva de me ensinar para sempre o valor de um sentimento chamado humildade. A Igreja, essa instituição a mais, deu-me flores e fezes na mesma bandeja – mas ao menos me deixou o livre arbítrio de fazer minhas escolhas. Agora, até isso me está sendo negado. E é por isso que eu vou pecar com uma altivez que em momento algum, ao contrário do que parece, contraria a humildade que a instituição me ensinou.
Vou pecar, com muita categoria, como diria o popular. E lhe convido a vir comigo, porque não é qualquer dia que se pode pecar contra a entidade máxima da catedral terrena que determina, aqui nas nossas instâncias inferiores aos céus desconhecidos, o que é e o que não é pecado – de acordo, claro, com os padrões de cada tempo e lugar. Você entendeu: vou pecar contra o próprio Papa – e é por isso que meu pecado não é e nem será em vão.
Por um momento, a maior autoridade da Igreja Católica pode estar tão mais errada do que eu, pecador , anônimo e insignificante seguidor, ainda que à minha maneira, como tantos outros, dos apontamentos de sua doutrina. Porque a derradeira ordem de Joseph Ratzinger pode ter sido, como nunca se esperou, a prova categórica que desmente aquela tão notória noção da infalibilidade papal.
Vou votar em Dilma e se você quiser, pode fazer como eu e Leonardo: pecar contra o erro ou pagar a penitência das abstenções.
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Um comentário:
Esse papa e sua igreja estão afundando.
O mundo tá precisando de revolução e ela não vai passar na tv, é verdade.
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