segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Os jornalistas estão cabisbaixos


Há um mal estar nas redações nesta reta final de campanha eleitoral. Onde um dia houve uma torcida mal contida pela vitória do operário e sindicalista Lula, hoje existe um silêncio daqueles que parecem gritar que alguma coisa precisa, mas não pode ser dita com todas as letras. Esse grito sufocado está na garganta de muitos jornalistas da minha geração, o povo que vem das utopias dos anos 80, hoje tidas como ridículas e inconvenientes. São colegas que parecem ter exigido de si mesmos uma censura interna que os impede de admitir qualquer forma de simpatia pelo que foi o governo Lula, sob pena de parecerem não ter a imparcialidade distante e a superioridade blasé de que o meio onde trabalham faz tanta questão.

Entendo boa parte dessa posição, não pretendo aqui baixar foices condenatórias sobre a cabeça de ninguém. Tenho plena consciência de que, no salve-se quem puder que virou o mercado profissional do jornalismo - uma situação crítica que vale tanto para os grandes centros da profissão como Brasília como para lugares como Natal - o profissional mediano, este que não é nem um novato nem uma estrela, precisa se manter minimamente quieto se quiser sustentar seu frágil vínculo empregatício. Eu mesmo só escrevo tais coisas aqui neste blogue porque tenho o privilégio de ter investido e sido aprovado num concurso público que me permite hoje ter como patrão a instituição Câmara dos Deputados, onde coloco a serviço da Tv Cãmara a experiência que adquiri ao longo da vida nas redações convencionais. Não fosse assim e muito possivelmente eu também tolheria a mim mesmo, porque afinal a sobrevivência imposta pelo vil metal fala alto diante de quem vive de salário.

Mas é por isso mesmo que eu até exagero aqui no blogue: pelo fato de poder falar sem aquela amarra, considero que minha obrigação é ser o mais eloquente quanto for possível, para que pela minha voz possam ser ouvidos aqueles colegas que, tenho certeza, se autocensuram e sofrem com isso. São amigos que até têm espaço para escrever e assinar embaixo em colunas de jornal. Mas não escrevem lá aquilo que dizem na intimidade de uma conversa casual. Seria arriscado demais. É uma
gente escaldada que sabe do perigo de comentar mais alto algo que, na cadeia de comando das redações, pode deixar de ser um sussurro de desabafo eventual e se tornar um brado não muito sintonizado com a linha editorial do veículo onde se trabalha. Um dia desses mesmo, tomei para mim a tristeza de ver um antigo colega de reportagem tendo que escrever no jornal loas a um político a quem esse mesmo profissional já tratou com muito mais do que reservas em comentários de blogues das novas mídias. Avalio, só de ler o texto assinado no papel, a extensão da violência que dever ter representado para ele a produção daquela matéria.

E hoje, lendo a edição do Correio Brasiliense, encontrei um texto que casa perfeitamente com tudo isso que vinha pensando antes de escrever esta postagem aqui. É a crônica diária da jornalista Conceição Freitas, que numa atitude corajosa e que vai de encontro a essa lei silenciosa da nova cultura jornalística, admite ao leitor que se sente, à maneira dela, deslocada no ambiente de trabalho quando o assunto é campanha eleitoral e cobertura da imprensa. Conceição quase chega a declarar seu voto neste segundo turno, mas nisso também se contém, imagino que pelos mesmos motivos que listei nos parágrafos acima. Mas tem a ousadia de externar um certo sentimento que circula entre uma categoria profissional que deveria ser a mais à frente de todas quanto o assunto é verdade, interesses políticos e limites ao exercício da cidadania.

Para ler a crônica completa de Conceição Feiras, clique aqui.

* E assim como Conceição, uso para ilustrar esta postagem uma imagem do filme "As invasões bárbaras", cujo emprego aqui é absolutamente auto-explicativo.

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