sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O eleitor de cada um


Talvez essa discrepância entre o Datafolha e os demais institutos de pesquisa eleitoral tenha uma explicação menos conspiratória do que somos tentados a imaginar. A discrepância, a esta altura, está bem clara: o Datafolha, instituto do jornal Folha de S. Paulo, um órgão de imprensa visivelmente engajado na campanha de José Serra, é o único a colocar em dúvida a possibilidade de vitória de Dilma Roussef domingo agora, resolvendo a disputa logo no primeiro turno. Sensus, Ibope e Vox Populi, que são os outros três, mostram, unanimemente entre eles, Dilma com 11 pontos de vantagem sobre a soma dos votos dos demais candidatos. É 11 x 2 (que é o percentual em que aposta do Datafolha, portanto dentro da margem de erro que justifica, para eles, a dúvida mais que conveniente). De maneira que quando as urnas forem abertas e a apuração se encerrar, além do resultado da eleição teremos também um veredicto sobre o desempenho e o papel dos institutos de pesquisa eleitoral.

Mas, como disse lá no início, a questão pode ser menos conspiratória do que a gente gostaria. A diferença de percentual pode encontrar explicação no método de entrevista que cada instituto utiliza, já que o Datafolha é o único que ouve pessoas nas ruas, em lugares de maior movimento, e não em casa, como fazem os demais. Mais de um analista já apontou essa diferença de método como provável explicação para a diferenta de prognóstico. Aqui do meu canto, tenho um elemento a mais a acrescentar - elemento que bate com essa explicação inicial e a torna ainda mais interessante.

A explicação está no comportamento do eleitor de cada um dos três principais candidatos. Pelo que eu vejo e ouço por aí, longe dos olhos dos repórteres viciados do Congresso ou dos aquários rarefeitos das grandes redações, é que o eleitor de Dilma - por extensão, eleitor de Lula - é um tipo quieto, embora decidido. O eleitor de Dilma sabe em quem vai votar há bastante tempo, não pretende mudar por pouca coisas, mas também não gosta de sair por aí discursando em favor da candidata. Porque ele é um eleitor, como dizia meu pai, "escabriado": ou seja, alguém que sabe que se sair por aí defendendo Lula em qualquer esquina de shopping corre o risco de ser hostilizado pela ex-classe média dominante. Então ele se cala, confiante no seu voto. E quando o instituto de pesquisa pergunta sua opinião, em seu domicílio, ele confirma o favoritismo de Dilma. Na rua, não sei não. Aliás, é um eleitor que não é muito de rua não - fica em casa, na moita, só urubuservando o blá-blá-blá lá de fora.

Nos últimos meses, o eleitor de Serra também tem sofrido um pouco desse temor de manifestação. Fosse nos tempos do "mensalão" e ele sairia por aí, na praça, na padaria, na fila do banco a bradar seu discurso anti-PT, sua pequena fúria contra o tal do "aparelhamento do estado" e outras coisas ocas de sentido e conteúdo. Mas agora, depois de Serra percorrer essa linha ora amigo de Lula ora crítico do governo, depois de seu candidato perder a classe natural que tinha como presidenciável em favor de qualquer apelo capaz de alavancar suas chances de vitória, este eleitor pisou no freio. Fica na dele o eleitor de Serra, especialmente se notar que transita em ambiente onde vicejam sinais da nítida ascenção social e cidadã proporcionada pelo governo Lula. Mas, ouvido nas ruas pelo Datafolha (o eleitor de Serra chega se arrepia de fervor ao ouvir o nome do instituto), declara rápido e rasteiro que é Serra, sempre será e sempre foi.

Dos três, o eleitor mais espevitado é o de Marina. Esse, ao contrário dos outros, parece até ter nascido nos seringuais do Acre de tanto que defende sua candidata. É verdade que grande parte deles, embora verdes até o talo, são tão urbanos, mas tão urbanos que só vêem a tal da natureza em viagem de carro, entre uma cidade e outra. Mas tome camiseta, cartaz gigante na janela do apartamento, adesivo politicamente corretíssimo. Porque Marina está na moda - e todo mundo quer estar na moda. Então, manifestar que "sou Marina" é hoje como portar um atestado de superioridade intelectual e política, um distintivo que faz de seu dono alguém acima da massa ignorante que vota em Dilma ou de certo segmento que ainda se deixa enganar pelos tucanos. O eleitor de Marina se acha o máximo - mas é bem o tipo que faz o mínimo para mudar o que quer que seja. Usar um broche, colar um adesivo no carro, separar o lixinho caseiro (que, quase sempre, será misturado de novo pelo carro de coleta do serviço de limpeza urbana), tudo bem. Agora, enxergar uma cidadã na empregada doméstica que tem em casa são outros quinhentos. Porque o eleitor de Marina, sendo cult, ou por isso mesmo, é bem hipócrita. E é ainda o eleitor que menos dá trabalho ao instituto de pesquisa. Onde quer que esteja, ele levanta o nariz e exibe sua soberba diante do entrevistador, como a dizer que não existe outra opção que não seja Marina.

2 comentários:

Unknown disse...

Eita Tiao! dessa vez vou ter que discordar de você ó, que generalizou o perfil do eleitor de Marina, porque não me enquadro nele...mas respeito, sua opinião, como sempre, e sempre reflito sobre ela. bjao

Titina disse...

Tião concordo com vc, o eleitor de Marina tem me parecido eleitor estranho e confuso que parece não querer enxergar as mudanças pelo qual o país está vivendo. É um voto sem personalidade e embasamento político, quase de protesto (falo do eleitor, não da candidata). Concordo que a candidata enriquece a discussão presidencial mas tb acho que ela fará muita falta nas reformas que o congresso terá que fazer nesse próximo mandato e nesse caso acho que ela poderia ter poupado sua candidatura à presidencia e garantido sua vaga no senado, onde fará muita falta por sua postura política e ética. Chego a achá-la inconseqüente em ter tomado tal decisão. MARINA FARÁ FALTA NO SENADO.