Ligo a televisão pouco antes da hora do almoço na expectativa de ver as notícias de Natal no telejornal da Inter TV Cabugi. Nada feito, ainda está na faixa dos desenhos. Pulo um canal e dou de cara com Micarla no “60 Minutos” da TV Ponta Negra. Pronto: começa o meu curso intensivo de política local, preparatório imprescindível para entender a disputa eleitoral pela prefeitura da cidade.
Micarla é um ás na telinha: apresenta reportagens, faz comentários, repreende o poder público, faz o diagnóstico das mazelas da cidade, lê e responde no ar os e-mails que recebe, manda recados para quem pede, cita carinhosamente os nomes dos telespectadores e, quase ao final, avisa que a partir de amanhã terá que se ausentar do programa porque a legislação eleitoral exige.
Os leitores que não são de Natal vão estranhar, mas Micarla é candidata a prefeita de Natal. Uma das duas principais candidatas – a outra é a deputada Fátima Bezerra, do PT. Dona de uma emissora de tevê que herdou do pai, o falecido senador Carlos Alberto, Micarla é um produto desse tipo de telejornalismo que fala mais diretamente a quem o assiste, dispensando as formalidades dos deles e delas da Rede Globo que, política à parte, confere um distanciamento mínimo ao tratamento da notícia. No telejornalismo de Micarla, não: a notícia exista para servir a ela – ao projeto político dela e de uma maneira que nem o maior escândalo global consegue rivalizar. Porque se o grande escândalo global tipo debate Lula/Collor choca o país e produz uma mudança a longo prazo, a presença diuturna da candidata no vídeo da tevê local passa despercebida e se perpetua, assim como seus efeitos.
E neste quesito, é preciso que se diga, Micarla é ótima. É impossível não simpatizar com ela, uma figura que nem de longe despertava essa empatia quando cursava, na mesma época que eu, o curso de Jornalismo na UFRN. É verdade que, na telinha, não vemos uma formuladora de políticas municipais. Mas, qual uma despachante eficiente, ela delega tarefas aos seus repórteres, pauta no ar os assuntos que o telespectador quer ver na tevê, ratifica cada reclamação, recobre cada denúncia urbana com o seu referendo pessoal de figura paternal e simpática. É a própria Wilma Faria – que apóia Fátima – rejuvescida pela cirurgia plástica da presença no vídeo, um privilégio que a atual governadora, ao contrário de Micarla, nunca teve – ao menos não com essa extensão.
Tudo seria ótimo se não houvesse, por trás desse birô de boas intenções midiático, um privilégio escandaloso, que é o fato de Micarla se servir de um canal de tevê herdado do pai, mácula do viciado sistema de concessões que deu origem ao espectro político da televisão brasileira. É uma experiência marcante ver Micarla na tevê resolvendo verbalmente os problemas da cidade com tal desenvoltura. Mas também é doloroso ver Micarla na tevê fazendo seu palanque eletrônico à custa de uma concessão pública que ninguém – e aqui é o poder da Globo que dá segurança a todos -, pelo visto ninguém nunca terá a coragem de rever.
Blogues e colunas
Desligo a tevê e vou aos jornais, onde viceja a nova onda da comunicação potiguar: as colunas que misturam política e sociedade. É o novo elixir da longa vida das folhas locais – fontes de informações picotadas que medem o sobe-e-desce das reputações e dos prestígios, acompanham cada pequeno passo da política mais diária, detectam cada inflexão no movimento geral do poder no estado. Se é assim, há de haver explicações: a ascensão vitoriosa do colunismo acontece porque existe uma demanda. A cidade que lê jornais gosta de passear pelas notinhas, a cidade que faz política gosta de se ver nela, a cidade que escreve as colunas gosta de se sentir próxima de uns e de outros. E assim o gênero se afirma.
O adversário mais próximo da coluna do jornal é o blogue – e muitas vezes eles caminham juntos. Eliana Lima na Tribuna do Norte está para Thaisa Galvão na internet como a Tribuna e o Diário estão para o site Nominuto (de longe a mais inovadora frente do jornalismo local, mas assunto para postagem futura). São pessoas que cavaram seu espaço, fincaram suas estacas no chão do noticiário dos acordos, das perspectivas e dos planos políticos e, pelo que conversei com mais de um amigo, tornaram-se quase imprescindíveis. Devem ser respeitadas por isso – e, nisso, deram um passo à frente do jornalismo local como um todo.
Se você tem alguma dúvida, basta colocar esse próprio texto aqui em questão: lá no início eu disse que Micarla e Fátima são as duas principais concorrentes à Prefeitura de Natal. Pois pode ser que Fátima nem seja mais: há três dias, ocupado com as obrigações da volta a Brasília, eu não passo nos blogues e colunas políticas de Natal e não sei qual o desfecho de um ataque à candidatura de Fátima, que corria o risco de fazer água no último fim de semana, quando voltei para casa. Desço a esses detalhes para que fique claro: é assim o mundo das colunas, dos blogues e da política neste momento em Natal – a qualquer hora, tudo pode mudar e os colunistas estão acordados para dar a notícia em primeiro lugar. Rosalie Arruda e Virgínia Coelli também estão na prática da neocolunismo tanto no papel quando na tela do computador – e o provocativo Ailton Medeiros, excessos à parte, cumpre seu papel de correr por fora e jogar sobre tudo isso o canhão de luz da polêmica.
Mas por trás de todo esse painel, está a cidade em si e sua encruzilhada de problemas, num momento que mistura expansão e retração. Há anos, nas minhas temporadas de férias em Natal, o que mais ouvia era reclamação pelos efeitos maléficos da entrada da cidade na rota do turismo internacional. Era a prostituição em Ponta Negra, era o custo de vida mais alto no supermercado, era a bolha inflada do valor dos imóveis – todos problemas reais, diga-se. Agora, curiosamente, deu-se o oposto: a grande reclamação da cidade é pela falta de turistas. Natal vai de um extremo a outro, sem o distanciamento necessário para reconhecer as vantagens do sucesso turístico tampouco o bom senso para evitar o crescimento insustentável. Mas não parece haver espaço nas colunas e nos blogues para a discussão desses temas. São assuntos áridos demais, que requerem espaço demais para ficar contidos no espaço das notas rápidas, afiadas e cortantes dos duelos da política partidária.
Portanto, quem quiser pode se habilitar: pelo menos na seara do jornalismo de colunas e blogues, há um espaço disponível a ser preenchido. Que tal um blogue dedicado a acompanhar a campanha política sob a perspectiva das propostas para resolver os impasses da cidade? Um blogue que vá acompanhando os candidatos quanto eles falarem sobre perguntas que incomodam o natalense? Ou que sirva como provocação para que eles falem claramente sobre esses problemas? Por exemplo: como eliminar definitivamente a presença no nitrato na água das torneiras? Como disciplinar a ocupação urbana em áreas como a divisa com Parnamirim? Como garantir que empreendimentos turísticos necessários (e não desprezíveis) na zona norte sejam acompanhados de obras de saneamento que não coloquem em risco a qualidade ambiental? Como reorganizar o trânsito para evitar os congestionamentos? Que política de urbanização vai ordenar a construção de mega-edifícios à beira mar? Os temas estão por todo lado, os candidatos estão nas ruas. Quanto ao blogue, quem se habilita?
Um comentário:
Quero parabenizar o bloqueiro pelos coment�rios acerca de natal, h� tempo n�o lia algo t�o real sobre nossa cidade, assim como da candidata Micarla, at� hoje n�o tinha lido algo que retratasse com tanta fidelidade ESSA MO�A,come�o a ler e vejo a mesma se desnudando perante o povo e finalmente fazendo cair sua mascara de boa m�o, mulher sensivel, solid�ria, preocupada em resolver as dificuldades dos pobres, apenas uma caricatura criada pela cenas de um canal de TV de sua propriedade e portanto com objetivo �nico de lhe promover e assim enganar o povo principalmente os que n�o tem forma�o e/ou informa�o critica e agora quando a legisla�o eleitoral n�o permite que ela seja a atriz principal da cena ela vai e coloca o "imperador" Luiz Almir para tomar o seu lugar e desavergonhadamente continuar a fazer o mesmo jogo de cena. Ainda bem que vivemos uma democracia e ainda que limitada podemos contar com pessoas que usam outras formas de comunica�o e informa�o para construir consciencias criticas
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