sábado, 27 de setembro de 2008

Os Manos e Caetano


Nossa fome de uma novidade menos média por vezes é atendida. Às vezes por uma criatura nova na curva das estradas das sensibilidades das artes, dos mercados, dos segundos cadernos hoje tão viciados mais que ainda assim estão lá, estão cá. Outras, pela revalidação de um homem velho que deixa vida e morte para trás. Aconteceu este final de semana de esbarrar em duas dessas figuras que, como sangue novo nas veias dos aparelhos médicos que mantêm vivo um enfermo em estado terminal de tédio, me deram um delicioso choque de juventude, inconformismo, reavaliação do que está acima, embaixo, em volta.

Como o atraso regulamentar, eis que este que vos filosofa descobriu, por acaso, a música do Charles Brown Jr., graça a um CD estilo formato mais barato impossível à venda no mesmo supermercado onde o mesmo vão blogueiro-filósofo abastecia a dispensa caseira. Era um daqueles indefectíveis acústicos MTV – mas, no meu atraso regulamentar, eu ainda sou capaz de gostar disso e de outras coisas mais que fariam o meu enlevado leitor sentir-se levemente enjoado; e só por isso não vou citar (outros) nomes.
Ocorre que o material auditivo detonado quando arremessei a bolacha de prata no tocador de plays foi pura energia de iniciantes, aquela intersecção de vigor, originalidade, ousadia e sensibilidade artística que tanta falta faz aos veteranos precocemente enriquecidos. Rejane que, matreira no canto dela, manja muito mais dessas novidades do que eu (eu, este conservador que smpre faz o mesmíssimo caminho de casa para o trabalho), me disse que os rapazes de Santos já passaram da fase mais criativa. Tá bom, mas pra mim, meus ouvidos preguiçosos e moucos, até ontem eles praticamente nem havia estreado em disco.

De maneira que me extasiei como há tempos não acontecia ouvindo letras de frases disparadas como discursos em forma de balas do bem (aquelas que ferem para extirpar tantos vírus), em balanço de instrumentos livres de formatações mais quadradas (aqueles que admitem e estimulam os comentários instrumentais mais sutis em meio à barulheira mais cerrada), na voz de um moço que, eu sei, uma coisa não parece ter nada a ver com a outra, mas me lembrou o velho Mick Jagger pela ginga, por um certo escracho cantado, por uma satisfação (juro que a palavra aqui apareceu por acaso) em verbalizar aquelas idéias necessariamente pouco lapidadas que estavam no ar daquela maneira, com aquela audácia vocal e ao mesmo tempo aquela falta de preocupação em fazer o resultado soar tão perfeitamente audível quando a impressão que se quer causar.

A outra novidade do fim de semana veio ao som do velho Caetano Veloso, que não decepciona esse fã ensimesmado. Bastou eu sapecar no tocador de plays o DVD com a gravação do show originário do disco “Cê” para perceber que, para além da performance despojada tão em moda (vide Los Hermanos), existe ali uma entrega e uma verdade juvenil que há muito não aparecia nos shows do sessentão baiano. Ver Caetano e aqueles três meninos descarnarem e reconstituírem “Fora de Ordem” do jeito que eles fizeram lá é mais ou menos como essas celebrações tão comuns no mundo médio do brasileiro cristão, que “renova” casamentos de cinqüenta anos de duração (se não ficou claro, isso foi um elogio entusiasmado). E o que dizer da recuperação – e sobretudo do rejuvenescimento, incrível rejuvenescimento – de faixas do disco “Transa”, aquele que, na verdade, a gente nunca deixou de escutar (não é mesmo Augusto Lula? ). Nem é preciso lembrar da reconstituição no show das músicas de “Cê”, mas é necessário sim terminar isso aqui dizendo que, pagas as entradas, agora terei de desembolsar – mas o farei feliz – um bolo de reais a mais na compra do CD com a gravação do show, disquinho que eu, este ouvinte errático e desconfiado das novidades, até ontem vinha desprezando não solenemente como diz o clichê, mas, digamos, casualmente.

Mea culpa: não o farei mais, vou comprar o disco e desde já o recomendo aos amigos (como se não fosse o último a descobrir o seu valor, mas deixa pra lá).
Viva os Manos e viva a música de Caetano.

2 comentários:

Anônimo disse...

Tião amo o disco CÊ. Poxa, Caetano é foda.
E por falar em TRANSA. Esse pra mim é o melhor disco de Caetano.
Escuto, escuto seempre. Sei todas as músicas de có.
É demais, é demais!
ah, e por falar no disco CÊ, tenho um amigo que disse achar um absurdo um velho como Caetano tá fazendo um disco rock in roll. Coitado desse meu amigo, se vê que nem de Caetano ele entende.
Pra mim Caetano é e sempre foi puro rock in roll.
É isso.

Anônimo disse...

mandei e-mail procê, depois dê uma olhada. beijins pra todos.