segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Utopia no museu



Arquitetura moderna e tropicalismo, estandartes coloridos e concreto recortado, mosaicos que ganham movimento e anos dourados em fotos de tamanho natural. Está tudo na exposição "Utopia da Modernidade", que reúne no mesmo espaço registros do arrastão estético que gerou Brasília e ícones reprocessados da jornada pop-antropofágica dos tropicalistas. É um programão caso você, por um motivo qualquer que a providência providencie, veja-se na iminência de - programa de índio? olha lá, pode não ser - visitar Brasília.

A exposição tornou ainda mais interessante o visual urbano do Conjunto Cultural da República, formado pela biblioteca (ainda sem livros, até quando?) e pelo museu, aquele vastamente conhecido como "Cuscuz de Niemmeyer" (para Cecília, que acompanhou a gente, traduzi como o "museu da bolona"). Acontece que parte das "peças" da exposição - como o seu próprio nome, "escrito" em garrafais caracteres de concreto em tamanho gigante - estão dispostas naquele pátio imenso que cerca a bola-museu. Você passa na rua - no caso , numa das seis pistas do Eixo Monumental - e é impossível não esticar o rabo do olho para entender melhor o que são aquelas letronas, aquelas molduras imensas de concreto, aqueles portais que até um dia desses não faziam parte da paisagem da cidade.

E vale a pena voltar no final de semana para ver de pertinho cada uma das intervenções concreto-paisagísticas que compõem a exposição, viajar pelas imagens que recuperam os movimentos vários daqueles tempos de explosão e implosão estética - tempos que pariram uma cidade e fermentaram tendências culturais (e comerciais, na conexão pop inevitável) várias.

Assim, um mosaico de Athos Bulcão ganha vida - no que parece uma dança sincronizada de andorinhas estilizadas no céu de Brasília. Uma tevê em preto-e-branco simulada transporta o olhar para outro tempo, um cone vai buscar no passado a música urbana da era JK e despeja sobre você a trilha sonora incidental de uma cidade em formação, um país em afirmação.


Se você tiver tempo, ainda pode aproveitar a visita ao Museu da República e percorrer, no andar de cima, outra exposição em cartaz - embora radicalmente diferente da que ocupa o primeiro piso e o pátio de cimento. É trabalho de artistas poloneses sobre tema bem menos inspirador, embora, vamos fazer o quê, igualmente legítimo sob a perspectiva das indagações humanas. O tema é a morte - e mesmo que o material de divulgação não informasse, você iria perceber assim que pisasse no primeiro ambiente onde há, no chão, projetada e continuamente repetida, a imagem de um pássaro debatendo-se em agonia.

Cecília e Bernardo estavam com a gente, ficamos enbatucados. Mas percebemos que as crianças têm um filtro: elas vão no que interessa a elas, ignorando nus do tipo "decadance avec elegance" e outras expressões sobre a finitude do pobre humano. Bernardo e Cecília, na verdade, propriciaram pra gente um momento-intervenção (como diria um artista plástico dos mais modernos): se divetiram mesmo foi com uma projeção interrompida, que apenas exibia aquele "protetor de tela" de DVD vazio, com a marca (Sansung? não lembro) batendo nas extremidades do quadro, quicando como uma bolinha. O que os garotos correram, pularem e riram enquanto tentavam "pegar" a sombra da marca que quicava na projeção não foi brincadeira. Foi arte - espontânea, viva, inquieta.

Breve, aqui, mais fotos da "Utopia da Modernidade".

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