quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

A grande cidade

Equador, Junco, Soledade, Juazeirinho. Não são apenas nomes de cidades do sertão da Paraíba, são um hino cantado a plenos pulmões pela boca seca da memória. De Parelhas a Campina Grande, as notas dessa canção em branco e preto vão sendo levadas no ar, como instrumentos que tocassem à janela de velhos ônibus, margeando incríveis cercas serranas feitas de pedras pretas, bem empinhadinhas, arte sertaneja exposta em museu vivo de beira de estrada. Estou refazendo, muitos anos depois, o percurso que primeiro me despertou a ansiedade de saltar bem alto da calçada que minha rua não tinha e ir cair lá longe, no coração da metrópole ao alcance da passagem da Jardinense.

O nome do lugar era Campina Grande. E lá havia uma rodoviária repleta de placas, lojas, bancas, ambulantes, sirenes, anúncios, doces, barulhos, carros e asfaltos - lá havia a vida que a minha rua, pobre, doce e quieta, me negava. Lá havia um imenso supermercado na boca de um açude gigantesco, o Híper e o Açude Velho, marcos visuais de uma idéia de grandeza. Havia tias adotivas que compreendiam essa ansiedade - Terezinha e Maria da Luz -, como havia a diversão garantida na companhia de primos igualmente regidos pelos laços não sanguíneos das afinidades mais espontâneas- as irmãs Jeane e Roseane, mais Afonso e Augusto, este primo de verdade e interiorano como eu. Havia a luz fosca mas já então deliciosa da televisão sem cores da Tupi, como havia uma radiola de onde brotavam interessantes musicalidades bastando para tanto que se colocasse um disco de Roberto Carlos ou da Orquestra Som Bateau. "Você meu amigo de fé, meu irmão camarada." Existia, e a esta altura já deve estar claro - se não estiver, a ineficiência da crônica inviabiliza o poema, mas paciência - um pacote de lugares, pessoas, imagens, sons e manifestações que conformavam o retrato da grande cidade brasileira dos anos setenta, com seu esplendor infantil e sua inocência continental.

Refazer o percurso que me levava a esse paraíso emoldurado foi, sim, colocar em risco o patrimônio da memória. Mas, felizmente, findo o caminho, não só a boa memória foi preservada como saiu meio que remasterizada em nova edição que salienta as cores, a intensidade, o vigor de momentos vitais para o menino que fizeram mais forte e verdadeiro o homem. Nem o cinema Capitólio detonado foi capaz de estragar o processo. E ainda deu pra rever, de dentro do carro mesmo - que todas as cidades cresceram muito e agora já não é tão fácil parar em qualquer ponto só pra apreciar a paisagem - o Açude Velho. A Vila do Sesc, meu Deus, como estará? A Praça da Bandeira, onde eu me abastecia de números difíceis da revista de Tex, também ficou para outra vez. Numa estada do tipo para pro almoço e seguir pra João Pessoa não deu para ir até lá. Mas o oitão vermelho do Híper ainda me sorriu como um velho amigo enquanto o carro girava na esquina do tempo.

2 comentários:

Anônimo disse...

Boa noite.


Na verdade a cidade de Equador fica localizada em nosso torrão potiguar. É - no dizer de um antigo político de quem não me lembro o nome - um pedacinho do RN que avança sobre a Paraiba.

Anônimo disse...

Esse texto tocou meu coração paraibano,também andei nessa época por Campina grande,lembro a cerração,o friozinho gostoso dos simpósios de literatura organizada por Elizabeth Marinheiro,o teatro municipal e seus festivais de inverno,o bar "refavela",o açude velho.....