quinta-feira, 17 de março de 2011

Cinemania


Há certo tipo de livro que a gente leva meses e meses lendo, por vários motivos. Porque se trata de livros enciclopédicos, que pedem tempo, paciência e degustação lenta. Porque a gente tem medo de acabar logo de uma vez e ficar com saudade quando chegar à última página. Porque o conteúdo é tão instigante que não dá pra ler sem parar um pouco aqui e ali para absorver melhor o que diz uma frase, um parágrafo, um capítulo. “Grandes Filmes”, o segundo volume de estudos sobre filmes feitos pelo crítico Roger Ebert, lançado pela Ediouro, é um desses livros. Não é nem mais uma novidade nas livrarias, mas aqui em casa continua nessa condição, já que se trata de um desses livros que se lê lentamente – até se abandona uns tempos, enquanto se aprecia outras leituras – até que chegamos à última resenha. Mesmo sem chegar a este ponto, adianto, pra degustação do leitor do SOPÃO, trechos de alguns dos estudos de Ebert, esse apreciador de cinema que não torce o nariz para títulos como “Alien”, embora obrigatoriamente tenha na sua carta de preferidos clássicos como “Amacord”.

OO7 CONTRA GOLDFINGER

Bond é um arquétipo tão persuasivo que seria um sacrilégio alterá-lo.


ALIEN

Uma versão dessa história, hoje, se deslocaria depressa para a parte em que o alienígena salta sobre os membros da tripulação. Hoje, os filmes violentos, do gênero ficção científica e outros, são cem por cento barganha e zero construção. O que o público aprecia não são os golpes cortantes, mas a expectativa desses golpes. Sinais, de M. Night Shyamalan, reconhece isso e pouco se importa com seus alienígenas.


AMADEUS

Não se trata de uma vulgarização de Mozart, mas um meio de dramatizar que os verdadeiros gênios raramente levam a sério a própria obra, porque esta não lhes demanda esforço. Grandes escritores (Nabocov, Dickens) fazem suas obras parecerem brincadeiras. Escritores menos brilhantes (Mann, Wolfe) fazem-nas parecerem esforços hercúleos. Salieri suava e se esforçava ao máximo para produzir pouca música: Mozart compunha com tamanha facilidade que “a música parecia lhe ser ditada por Deus”, segundo uma queixa de Salieri.


AMACORD

O filme retrata “memórias” de memórias, transformadas pelo afeto e pela fantasia e muito valorizadas pela narrativa. Fellini reúne as lendas de sua juventude onde todos os personagens parecem maiores e menores que na vida real – atores brilhando em seus palcos particulares.


BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES

O cinema de animação era considerado um entretenimento infantil, seis minutos de gags envolvendo ratos e patos, antes do cinejornal e do filme principal. Branca de Neve demonstrou que a animação poderia libertar um filme da armadilha de espaço e tempo; que brevidade, dimensão, limitações físicas e regras de movimentos poderiam ser vencidas pela imaginação dos animadores.


OS BRUTOS TAMBÉM AMAM

Se introduzirmos Freud nesse filme, descobriremos toda sorte de possibilidades, como quando o recém-chegado vai à taberna vestindo roupas pouco viris e é insultado e castigado pelos brutamontes até sacar a arma e provar que é melhor.


OS IMPERDOÁVEIS

Se o western não tinha morrido, estava morrendo; o público preferia ficção científica e efeitos especiais. Era hora de uma elegia.

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