Matt Demon surgiu no cinema como um garoto prodígio em "O gênio indomável". Triplamente prodígio: uma vez pela contundência da interpretação; duas pelos dons próprios do personagem, um auxiliar de limpeza com um cérebro muito melhor do que o dos alunos da univerdade onde limpava o chão; e três pelo fato de também ter sido um dos roteiristas do filme.
Agora, Matt Damon está se especializando em personagens do tipo duas caras. É o mais bem sucedido falsário do cinema americano. Começou a esculpir essa segunda natureza em "O talentoso Ripley", filme em que, movido por uma inveja pra lá de obsessiva, assume a identidade de um amigo rico. Retocou a performance na série iniciada com "A identidade Bourne" - onde, além do mais, nem ele mesmo tinha idéia de quem, de fato, fosse. E, mais recentemente, lapidou essa trajetória sob a batuta de Martin Scorsese em "Os infiltrados", canal de expressão para um belo duelo de sutilezas possíveis no cinemão ianque com o parceiro Leonardo DiCaprio. E ainda poderia incluir na mesma lista "O bom pastor", onde o sempre dissimulado Damon volta a exercitar seu ofício preferido - despistar todo mundo.
Nos últimos tempos, são raros os filme a que tenho assistido mais de uma vez. Antigamente, tinha um prazer especial nesta segunda leitura - especialmente se fosse feita imediatamente em seguida à primeira, na era (já distante) das sessões contínuas pelo preço único. Pra o leitor ter uma idéia, cheguei a passar seis horas seguidas socado no cinema São Luiz, em Recife, assistindo, de queixo atropelado, a "Era uma vez na América", aquela enciclopédia visual e emocional do mestre Sergio Leone. Mas nem sempre é assim. Acontecia muito de, na segunda exibição, dar-se a morte fulminante daquela boa impressão inicial na primeira. Outras vezes, a releitura revelava camadas que a aflição narrativa da primeira exibição não deixava o espectador aqui perceber.
Depois que as sessões contínuas acabaram, ainda havia o prazer de rever em VHS (e depois, claro, no DVD) aquele filme que deixou a gente com água na boca, querendo mais, no cinema. Mas, de uns tempos para cá, razões familiares e rotinas profissionais incluídas na conta, nem uma coisa nem outra tem sido muito possível. Dou-me por satisfeito quando consigo assistir àquele filme que queria tanto ver na época em que foi lançado. O tempo é outro, talvez eu também não seja a mesma pessoa. Enfim, o velho papo do rio que você nunca atravessa duas vezes.
Essa viagem toda é só para explicar do prazer que foi rever "Os infiltrados", com a já lustradíssima dupla performance de Matt Damon e a milionésima (mas sempre boa) danação de DiCaprio. E para demarcar: esse eu havia visto no cinema, na época do lançamento, embora já quase saindo de cartaz, e não havia gostado nem um pouco. Pareceu-me um item comum e preguiçoso na cinematografia de Scorsese - que afinal, depois de quase mendigar (sem precisar prestar-se a isso), levou pra casa seu Oscar semi-honorário.
Outro dia, outra postagem, eu disse aqui que o cinema vem se tornando pra mim algo muito mais ligado aos efeitos dos que aos conteúdos. Era disso que falava: com pouco tempo pra ver os filmes, e muito menos para rever - o que é uma pena - passei a prestar muito mais atenção ao que eles fazem comigo numa primeira - e quase sempre única - exibição. Alguns são infalíveis e surpreendentemente bons neste quesito: assim de passagem, lembro de um de outra época, "Pulp ficcion", tão menos impactante na segunda, terceira, quarta exibição.
Mas é possível incorrer em equívocos, porque o sujeito que sai de casa ou do trabalho para ir ao cinema nem sempre vai sozinho (leva problemas, trabalhos inconclusos, expectativas dispersas, muxoxos incoscientes e por aí vai). E, assim, às vezes, a primeira - e única - exibição causa uma impressão errada. Aconteceu isso comigo e os infiltrados de Scorsese. Tá certo que o filme tem muito menos maneirismos de câmera e montagem do que eu sempre espero de Scorsese. Parênteses: quanto mais maneirismo nos filmes dele, pra mim, melhor; vide aquele bloco de "Os bons companheiros" em que Ray Liotta, completamente cheirado, escapole da polícia, faz entregas, prepara uma refeição e ainda arruma tudo para uma fuga que eu nem sei mais se foi bem ou mal sucedida, isso tudo ao som dos Rolling Stones, sob a mão de anjo de Thelma Schoonmaker, a montadora de todas as sinfonias scorseseanas (e que também ganhou o Oscar por "Os infiltrados").
Agora, Matt Damon está se especializando em personagens do tipo duas caras. É o mais bem sucedido falsário do cinema americano. Começou a esculpir essa segunda natureza em "O talentoso Ripley", filme em que, movido por uma inveja pra lá de obsessiva, assume a identidade de um amigo rico. Retocou a performance na série iniciada com "A identidade Bourne" - onde, além do mais, nem ele mesmo tinha idéia de quem, de fato, fosse. E, mais recentemente, lapidou essa trajetória sob a batuta de Martin Scorsese em "Os infiltrados", canal de expressão para um belo duelo de sutilezas possíveis no cinemão ianque com o parceiro Leonardo DiCaprio. E ainda poderia incluir na mesma lista "O bom pastor", onde o sempre dissimulado Damon volta a exercitar seu ofício preferido - despistar todo mundo.
Nos últimos tempos, são raros os filme a que tenho assistido mais de uma vez. Antigamente, tinha um prazer especial nesta segunda leitura - especialmente se fosse feita imediatamente em seguida à primeira, na era (já distante) das sessões contínuas pelo preço único. Pra o leitor ter uma idéia, cheguei a passar seis horas seguidas socado no cinema São Luiz, em Recife, assistindo, de queixo atropelado, a "Era uma vez na América", aquela enciclopédia visual e emocional do mestre Sergio Leone. Mas nem sempre é assim. Acontecia muito de, na segunda exibição, dar-se a morte fulminante daquela boa impressão inicial na primeira. Outras vezes, a releitura revelava camadas que a aflição narrativa da primeira exibição não deixava o espectador aqui perceber.
Depois que as sessões contínuas acabaram, ainda havia o prazer de rever em VHS (e depois, claro, no DVD) aquele filme que deixou a gente com água na boca, querendo mais, no cinema. Mas, de uns tempos para cá, razões familiares e rotinas profissionais incluídas na conta, nem uma coisa nem outra tem sido muito possível. Dou-me por satisfeito quando consigo assistir àquele filme que queria tanto ver na época em que foi lançado. O tempo é outro, talvez eu também não seja a mesma pessoa. Enfim, o velho papo do rio que você nunca atravessa duas vezes.
Essa viagem toda é só para explicar do prazer que foi rever "Os infiltrados", com a já lustradíssima dupla performance de Matt Damon e a milionésima (mas sempre boa) danação de DiCaprio. E para demarcar: esse eu havia visto no cinema, na época do lançamento, embora já quase saindo de cartaz, e não havia gostado nem um pouco. Pareceu-me um item comum e preguiçoso na cinematografia de Scorsese - que afinal, depois de quase mendigar (sem precisar prestar-se a isso), levou pra casa seu Oscar semi-honorário.
Outro dia, outra postagem, eu disse aqui que o cinema vem se tornando pra mim algo muito mais ligado aos efeitos dos que aos conteúdos. Era disso que falava: com pouco tempo pra ver os filmes, e muito menos para rever - o que é uma pena - passei a prestar muito mais atenção ao que eles fazem comigo numa primeira - e quase sempre única - exibição. Alguns são infalíveis e surpreendentemente bons neste quesito: assim de passagem, lembro de um de outra época, "Pulp ficcion", tão menos impactante na segunda, terceira, quarta exibição.
Mas é possível incorrer em equívocos, porque o sujeito que sai de casa ou do trabalho para ir ao cinema nem sempre vai sozinho (leva problemas, trabalhos inconclusos, expectativas dispersas, muxoxos incoscientes e por aí vai). E, assim, às vezes, a primeira - e única - exibição causa uma impressão errada. Aconteceu isso comigo e os infiltrados de Scorsese. Tá certo que o filme tem muito menos maneirismos de câmera e montagem do que eu sempre espero de Scorsese. Parênteses: quanto mais maneirismo nos filmes dele, pra mim, melhor; vide aquele bloco de "Os bons companheiros" em que Ray Liotta, completamente cheirado, escapole da polícia, faz entregas, prepara uma refeição e ainda arruma tudo para uma fuga que eu nem sei mais se foi bem ou mal sucedida, isso tudo ao som dos Rolling Stones, sob a mão de anjo de Thelma Schoonmaker, a montadora de todas as sinfonias scorseseanas (e que também ganhou o Oscar por "Os infiltrados").
Senti falta disso em "Os infiltrados". Mas, ao rever o filme em casa, vi que essa ausência não é o defeito que enxerguei quando da exibição no cinema. Ao contrário, essa falta de moldura nervosa é até uma qualidade de "Os infiltrados", viu? E a vilania de Jack Nicholson é tão cruel, tão cruel que afasta a possibilidade de a gente ver ali uma nova caricatura desse outro ator que de tão bom também vive recorrendo à autoparódia.
Agora eu pretendo rever em casa o último James Bond, de que muito gostei quando vi num cinema do Praia Shopping, em Natal. Será que o filme vai conservar aquele sabor vespertino de férias que havia em torno de mim quando o vi pela primeira vez?
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