quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Já para a Rede


A rede social pulou da internet para o cinema, com o filme do mesmo nome. Na tela grande, essa rede foi tesionada em ponto máximo. O resultado da eletricidade desse puxão é um filme trêmulo de agilidade, apiléptico da primeira à última cena, uma narrativa visual que se revira várias vezes sobre si mesma para mostrar os desdobramentos que uma idéia criativa pode ter quando se torna refém das normas inerciais do mundo corporativo. Em resumo, A REDE SOCIAL é, sozinho, um filmaço - e, inscrito no panorama do cinema e da cultura pop-tecnológica atual, um marco do nosso tempo.

Como até os recém-nascidos já sabem, o filme conta a gênese do Facebook, rede social que avança quem nem cavalo galopante sobre tabletes, celulares e demais congêneres informáticos desse nosso tempo urgente e ansioso. Só que isso é pouco para definir o filme, uma vez que ele, ao tomar o Facebook como ponto de partida, acaba por desenhar um painel completo sobre os novos formatos de negócios que vão surgindo na esteira do que um dia foram os desprezados nerds das high schools americanas. A REDE SOCIAL avança na psicologia desse tempo, focalizando desde o cinismo inevitável do jovem minimamente dotado de genialidade até a falsa vocação vitoriosa de quem nasce em berço privilegiado e acha que por isso o mundo tem de se curvar o tempo inteiro à sua pessoa. Está no filme o insight mínimo de simplicidade inspirada que costuma levar para a frente idéias prenhes de lucros que delimitam nossas novas rotinas de e-mails, amigos adicionados e ídolos a serem seguidos como se fôssemos um renovado tipo de detetive virtual debruçado sobre informação aberta e tudo e a todos. Tem Bill Gates e Steve Jobs na tela dessa REDE SOCIAL, como tem o mais recente alvo da atenção planetária, o responsável pela bisbilhotagem meio cidadã meio temerária que é o Wikileaks.

E tudo isso de uma maneira que você nem precisa ter perfil no Facebook para entender, acompanhar e se deliciar com as conexões traçadas em forma de imagens, diálogos e situações. Um quadro que se alimenta de todas as tensões possíveis - as mais humanas quanto se possa imaginar, algo bem diverso do que se poder esperar de um filme que, a princípio, trata de linguagens etéreas como devem ser a dos produtores de mercadorias destinadas ao uso via internet. Pois sobram tensões no filme, entre o garoto que criou a rede social em questão e seu amigo e parceiro dedicado a viabilizar o veio empresarial do negócio (com o que mantém o amigo gênio minimamente linkado à realidade à sua volta); entre o garoto e a garota por quem ele está interessado mas, incompetente no relacionamento tanto quanto genial nas idéias puras, desperdiça todas as chances como quem queima navios nem um pouco virtuais; entre o mesmo garoto e a dupla de gêmeos bem posicionados na vida que confudem a extração vitoriosa do clã familiar de onde provem com a possibilidade efetiva de sucesso autoral por parte deles mesmos.

E aqui há uma frase, dita pelo protagonista, que cimenta tudo - a genialidade contrariando o favorecimento, a espontaneidade dando uma rasteira nos planos de quem já nasceu com tudo a ser favor. É quando Mark Zuckerberg, o tal garoto criador do Facebook - e acusado de roubar idéia alheia e trapacear geral, o que é o gancho narrativo do filme todo - comenta o fato de os gêmeos não se conformarem com o fato de perderem a propriedade da idéia que julgam exclusiva: - O problema não é eles terem perdido o site, mas o fato de terem sido contrariados pela primeira vez na vida. Ou algo similar, que transcrição literal nem sempre garante a precisão da idéia.

Melhor que isso só mesmo a cena em que o diretor da universidade despacha a dupla de gêmeos remadores vitoriosos, donos do mundo e bem chatinhos com uma preleção bem pouco acadêmia - mas bem aguda na sua redundância - sobre a real natureza da competitividade no ambiente da instituição que a todos os personagens abriga. Os mais chegados às idéias de empreendedorismo vão se arrepiar, mas os menos competitivos também - e pelo mesmo motivo: por se tratar de um discurso sobre como se posicionar na vida em geral e não apenas numa rede social em particular.

Caia nesta rede o quanto antes, veja o filme no cinema, não fique esperando pelo lançamento em DVD - que se trata aqui de algo feito para ser visto e ouvido em sala escura, tela grande, impacto garantido e que não se perde no burburinho da sala de estar. A rede é pop, o papo é sério e o filme está muito mais do que à altura dessa onda toda. A ele, nos cinemas, já - com a urgência dessa postagem escrita às pressas, antes que um outro assunto tome o lugar das notas que eu não escrevi antes de digitar isso aqui à guisa de perfil que seja em rede social qualquer.

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