quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Fogo de cerrado


Aqui a situação no entorno do 7 de setembro é a seguinte: pela manhã, você abre a janela do quarto pra deixar entrar a friagem matinal, fecha os olhos, aspira e...descobre que tem uma baita fumaça no ar. No seu quintal mesmo. E não é que você tenha aderido ao superado método da queimada agrícola como técnica condenada de manejo de solo. O que acontece simplesmente é que você mora em Brasília – uma condição que felizmente não se aplica a boa parte dos leitores deste blogue que podem se considerar felizardos.

Antes que os leitores brasilienses saiam do sossego dos seus lares esfumaçados para reclamar de que a gente está a falar mal do prato que come – ou seja, da cidade onde vive e ganhamos dinheiro – é preciso que o blogueiro afoito lembre que, por maior que seja o amor por Brasília, alguma rusga há de haver quando chega o período agosto-setembro-outubro. São os meses mais pesados da seca brasiliense, esse fenômeno que dá novo significa ao dissílabo que o sul maravilha se acostumou a usar como caracterização meteorológica do Nordeste. Ah, o que é a seca do Nordeste com seus flagelados pra quem todo mundo pode enviar um donativozinho quando comprada à seca de Brasília, muito mais democrática, sem distinguir rico de pobre, a não ser pela capacidade dos mais afortunados de ter uma piscina em casa ou um lote maior de umidificadores de ar. Mesmo assim, quem vive aqui sabe, o dano é quase total. Em Brasília, seca é seca – e não se fala em atenuantes. O que é uma toalha molhada no quarto perto daquela coceirinha de pinicadas que dá na pele do cidadão enquanto ele tenta de alguma maneira ingressar no que o resto do país, especialmente as doces zonas litorâneas, chamam de sono.

De noite na cama, todo mundo sente o efeito da seca – e não estou falando de sexo, rapaziada. E de dia no trânsito é outra maravilha, especialmente pra quem tem criança pequena dentro do carro, mostrar aquele espetáculo de curiosidade quase natural que são os milhares de gramadinhos esturricados depois das queimadas urbanas que ninguém consegue controlar. Não sei os seus, mas os meus meninos ficam de queixo caído e olhar esbugalhado diante de tal acontecimento.

Às últimas notícias, chupadas do portal do Correio Braziliense: nesta quarta-feira, o Corpo de Bombeiros do DF tentava controlar dois grandes incêndios, o maior deles na reserva ambiental Estação Ecológica de Águas Emendadas, em Planaltina, e o outro na Chapada Imperial, próximo a Brazlândia. Tenho que explicar para meus dedicados leitores potiguares ou radicados no RN que Brazlândia, em períodos normais, é uma espécie de capital do morango no Planalto Central. É uma cidade pequena, coalhada de japoneses que transformaram suas terras em um painel agrícola em verde e vermelho, iniciativa que garante inclusive uma bem fornida festa do morango em período menos seco, claro. O Correio informa ainda que apenas na Estação Ecológica de Águas Emendadas mais de 90 militares trabalharam para apagar as chamas, sem falar em sete viaturas e um helicópero da corporação. Ah, sim, o jornal conta ainda que outros seis – eu li seis, está escrito no portal – incêndios em Taguatinga – cidade que dispensa maiores explicações – não foram “atendidos” – o verbo empregado pelo jornal foi esse mesmo – por falta de pessoal.

Bem: Taguatinga fica pra um lado, Planaltino no outro extremo e Brazlândia assim meio de banda. De maneira que, morando no Lago Norte – ainda que provisoriamente, num esquema de emoções de última semana – é natural que a gente se sinta cercado de fumaça por todos os lados. E compreenda muito bem que, até outubro se anunciar e novembro se instalar de vez, nada mais natural do que ao abrir a janela para deixar entrar a fiagem matinal, a gente na verdade esteja trazendo para casa um pouco daquele clima nem um pouco ameno que reina absoluto como o sol da tarde lá fora. E não vou nem falar nada sobre o calor – que de calor, quem me conhece sabe, eu gosto e muito. O problema é o fumaceiro e a falta de água na pele do ar.

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