sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Fala, Tiririca!


Como eu não prometi nada, o que fizer é lucro. Noves fora a idéia de que exercer um mandato parlamentar é "fazer" alguma coisa, mais uma vez o nobre deputado Tiririca construiu uma frase definidora da política representativa brasileira no que ela tem de mais essencial. Fosse dita por um Cristovam Buarque, um Pedro Simon, e descontado o caráter linguístico marcadamente popular da segunda parte da frase, estaria ela sendo brandida, como um estandarte da decência, por todos os novos profetas do Brasil anticorrupção que marcaram o sete de setembro seco e fervente de Brasília.

Pena que tenha sido pronunciada por Tiririca, o mais incapaz dos brasileiros para exercer o mesmo mandato parlamentar de onde ele tem retirado essas pérolas. Acusado de analfabetismo (o que é bem provável que seja mesmo, mas isso só recobre suas frases de uma camada a mais de brilhantismo), repudiado pelos bem-pensantes, identificado como palhaço-deputado ou vice-versa, pois vem justamente de Tiririca essas conclusões que, entre toneladas de palavras despejadas todo santo dia na tribuna do Plenário Ulisses Guimarães, destacam-se como um sol solitário no sistema nem um pouco solar da algaravia parlamentar de cada dia.

Aqui se trabalha muito, mas se resolve muito pouco, foi mais ou menos essa a frase anterior com que Tiririca começou a desvendar, com 500 anos de atraso, a lógica perversa da democracia representativa à brasileira. Agora ele se sai com uma nova sentença, igualmente reveladora como a anterior e, com isso, vai construindo um mandato que cumpre à risca aquela que seria a promessa implícita na sua provocação, digo propaganda, eleitoral: você saber o que faz um deputado federal? Vote em mim que eu lhe digo. Dito e feito.

O curioso é que Tiririca, tido como vulgar produto do que mais atrasado existe no público eleitoral brasileiro, dispara suas frases emblemáticas com a parcimônia dos budas, a sapiência em gotas de um Dalai Lama. Se a imagem que se tem dele, pelo menos a pré-eleitoral, é exatamente o oposto disso, tanto mais impactante se fazem as frases que vai soltando ao vento, de maneira esparsada como convém às setenças que, tão carregadas de significado, exigem tempo para que possam ser lidas em sua totalidade.

Tiririca, com suas três frases lapidares (Vote em mim se quer saber o que faz um deputado; Aqui se trabalha muito e produz pouco; Como não prometi nada o que fizer é lucro) vale por um curso de ciência política dado por quem menos se espera; elimina no altar das evidências o preconceito de que foi vítima ao ser acusado de analfabetismo por uma revista semanal que estampou sua cara na capa como sinônimo do nível de Congresso que acabáramos de eleger; obriga o país a dar a cara à tapa ao reconhecer que pode sim vir do menos equipado intelectualmente a análise mais sintética do sistema político. Curiosamente, e para reforçar, um sistema que o acolheu muito mais como expressão de desvio do que como exemplo de mérito.

Tiririca e suas frases é isso: como pingos de sabedoria empírica extraídas a fórceps do processo político por um homem comum que, de tão brasileiramente baço, não se intimida diante do sistema. E o traduz como se fora um iluminado a quem todos, cegos de preconceito e bom gosto, fecham os olhos para não ver.

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