quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Um filme, por favor


Nem “Cisne Negro” nem “O Turista”. Tampouco adianta assobiar de soslaio e entrar numa sessão obscura de “Malu de Bicicleta”, que dá tudo na mesma. Uma ventania de filmes ruins, uns reconhecidamente e outros não. O cisne platinado, embora ilustrado pelo rosto belo e expressivo e CDF de Natalie Portman, termina sendo o pior entre eles. Isso mesmo que você pensou numa conclusão a jato: exatamente por ser o mais pretensioso do conjunto. Aos demais, dá-se o desconto de já nascerem candidatos a nada. Daí porque “O Turista” e “Malu de Bicicleta” devessem sofrer menos, caso gente fossem – e não filmes tentassem ser.

Do Cisne, brota do fundo da tela logo no início uma estranha lembrança de certa “Carrie, A Estranha”, às voltas com uma mãe fanática até a caricatura em produção de idêntico nome. Ah, mas aquilo era um Brian de Palma legítimo, sem vergonha de ser popular, orgulhoso dentro da sua beca costurada pelo fazedor de múmias pop e não literárias Stephen King. Aqui, não: trata-se de produto fino – e o tema em exibição, a busca da perfeição e o enfrentamento da própria maldição por meio da grande arte do balé já diz tudo. Mas a fila anda, o filme roda e, já a caminho do final se descobre que a profundidade do lago desse cisne não vai muito além daquela contida no balde de sangue de porco que os antinerds de Brian de Palma derramaram sobre Sissy Spacek, coitada. Do que se deduz que a garota esquisita dos anos 70 sofreu tanto quanto a ex-aluna de Harvard neste grande acontecimento do terceiro milênio – só que de forma condensada. Sim, de uma maneira ou de outra as duas conheceram seus demônios. A diferença é que no filme de 1976, popular, rasteiro e imediatista que seja, essa jornada rumo ao que de mais escuro há em cada um soou mais tensa e verdadeira do que na girândola sombria e ao mesmo tempo clean armada pelo novíssimo cineasta Darren Aronofsky para sua Portman brilhar. (Pessoalmente, fiquei mais sensibilizado pela presença rápida, mas notável e ofuscante no filme, de Winona Ryder, a quem não via na tela grande desde que devia ter – eu, não ela – uns vinte e poucos anos, mas isso é outro papo).

De maneira que o cisne, negro ou branco, pareceu-me, embora belo, raso e fugaz como os vampiros chiques de “Fome de Viver”, por sinal o filme inaugural de outro cineasta acusado de hipoglicemia estética mas que não faz por menos e orgulha-se, hoje em dia, de filmar uma pequena catástrofe atrás da outra: Tony Scott (enquanto o irmão, Ridley, oscila entre o sistema e sua superação). A impressão, nos corredores escuros daquele presídio disfarçado de coxia de teatro que se vê em Cisne Negro (repare nos blocos crus de concreto que servem de paredes) é de que o vampirão David Bowie vai entrar em cena a qualquer momento. Ou de que Natalie Portman só vai mesmo achar seu lado negro – ôche, e ela não deveria ter tropeçado nele quando fez sua parte na saga do “Star War”? – quando Catherine Deneuve, outra chupa-sangue de elegância exemplar do velho filme de Scott, entrar em cena. E pressente-se que isso pode acontecer a qualquer momento.

Aí o pobre cinéfilo desorientado, com poucas horas de folga de filhos e compromissos para se trancar na sala escura, olha para o lado em busca de alguma coisa menos assumidamente ordinária do que “O Turista” – que, vá lá, até diverte e merece menos bofetadas do que está levando, justamente por envergar orgulhoso a mesma canastrice que o “Cisne Negro” tenta disfarçar – e arrisca alguma coisa leve como... “Malu de Bicicleta”. Promessa de um filme solar, carioca, leve, sentimentalóide como convém de vez em quando, ligeiro, suave e, se possível, divertido. Foi quase isso a adaptação que o comumente produtor Flávio Tambelini fez com um livro menos conhecido de Marcelo Rubens Paiva. Mas logo todas aquelas promessas não muito confiáveis confirmam sua quase também anunciada não-realização. É quando o filme, indeciso entre ser paulistano-entediado e carioca-deslumbrado, sucumbe a uma montanha de chiclês sobre relacionamentos moderninhos e galinhagem politicamente justificada, numa mal referida abordagem de um tema clássico, a velha infidelidade duvidosa de uma Capitu-maldição que deve fazer Machado de Assis querer destruir cada um dos incautos que ousaram lhe fazer, como se diz mesmo?, uma “homenagem”.

Portanto, as esperanças estão depositadas em “Bravura Indômita” (embora desconfie que bravura não é bem algo que faça parte do universo dos irmãos Cohen), “Um Lugar Qualquer” (da eficientemente contida Sophia Coppolla) e, se é para escrachar de uma vez, o tal “Incontrolável” (que vem a ser o nome do vigésimo milionésimo thriller que o irmão de Ridley Scott roda com Denzel Washington).

2 comentários:

biu disse...

enter the void, de Gaspar Noe, um argentino gente boa:http://www.youtube.com/watch?v=lI89ovR36r0
ou Limites do controle, de jim Jarmusch:http://www.youtube.com/watch?v=NU9c_G5cL78 se o cinema não passa a gente baixa.

ana sua mana disse...

também não gostei muito do cisne, sebá. mas fiquei curiosa: e o discurso do rei, não quer assistir não? eu quero, junto com bravura indômita. o turista, não vi ( e nem quero, pra falar a verdade).
beijins.