sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Carta aberta para Adriano e Flávia

Uma das melhores coisas do mundo é quando grandes amigos que, por força das circunstâncias ou da distância mesmo, você não pode ver todo dia ou ao menos uma vez por semana lhe manda um e-mail, uma carta ou dispara um telefonema dizendo que está para chegar. Fiquei sabendo ontem que Adriano e Flávia estão de malas prontas para uma curta mas intensa temporada brasiliense de cinco dias. E vão ficar lá em casa, aquela velha porém nova casa domingueira, cujas janelas, sempre que são abertas toda manhã, parecem implorar com sua voz de rangido metálico: - E os amigos, cadê os amigos? Traga todos para cá, ou ao menos um de cada vez de vez em quando!

Então, como se fora uma maquinação metálica das nossas janelas conspiratórias, chega a notícia da iminente chegada do casal de Sousa, por sinal - e isto é sobremaneira importante, como diriam as portas de vidro que se abrem em par e também são dadas a uma conversa - o mesmíssimo que me abrigou quando um vento bateu na minha cabeça e eu decidi encarar uma tentativa de morar em Brasilia que, todo mundo sabe, enfim, muito me rendeu. Apois: essa postagem de frases saramagueanas (no sentido de tamanho, claro; não no estritamente qualitativo) é para servir como mensagem de boas vindas aos amigos, dizer da cidade para onde eles carinhosamenet me trouxeram, da capital onde eles próprios por tanto tempo viveram e, quem sabe, para onde ainda podem voltar, nunca se sabe.

Adriano, Flávia, aquela pontinha da Asa Norte continua linda! Agora, então, com as chuvas, as plantas estão estourando de verdes, as crianças prateadas de vivacidade, o comércio burburando de movimentado, a tesourinha tonteando de asfalto e tráfico, os mendigos desempenhando com a elegância que só eles podem ter aquele papel que a natureza lhes reservou. Aquela estrada de prata, ladeira de vagalumes ascendentes que é a continuação do Eixão rumo a Sobradinho fica, a cada noite, mais reluzente. E, apesar da chuva, nunca mais um raio fulminante caiu no pedaço, energizando ao limite da morte uma patética, de tão anônima, vida humana.

O cachorro quente, essa tradição das entrequadras, segue firme por lá. Só não sei se é o mesmo dos tempos em aqui cheguei, escapando do frio de maio na casa de vocês. Se for o mesmo, está mais velho - o que não é nada mal neste mundo veloz que de nós tomou conta a partir de algum momento do ano de 1998. Tem um ponto na comercial que não toma jeito - nada emplaca. A última tentativa foi uma sorveteria, mas a qualidade do gelado não estava à altura da atmosfera daquele cantinho de mundo que se chama 215/216 Norte. A locadora de vídeo, sim, está firme - embora tenha mudado de nome, de dono, de leiauti, de funcionários. Nesse processo, perdeu um pouco de alma - mas quem não perdeu de 98 pra cá? Deixa ela.

Deixa nós. Só o fato de transitar nem que seja rapidinho pelo rasgão de asfalto que divide os dois lados da comercial da 216 já é suficiente para trazer de volta às narinas um pouco daquele cheiro de humanidade que foi se perdendo. E depois tem o Parque Olhos d'Água que transpira muito mais no verão chuvoso daqui, a velha e boa Musical Center que nos socorre do futuro com um punhado de vinis saudosistas, e as bancas de jornais, com seus donos cheios de conversas que nenhuma força de mercado será capaz de tragar.

P.S.: Carlão, agora só falta você chegar com Sônia. Eu e Rejane vamos aguardar.

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